O que são sintomas psicológicos?

A busca incessante pela causa dos sintomas

“Uma donzela que não sabemos de onde veio e gostaríamos que fosse embora da mesma forma”

Essa é a forma que Freud usou para falar dos sintomas que nos acometem e que tem uma origem desconhecida.

Sabemos que existem certos sintomas que nem mesmo a medicina moderna não conhece a causa. Existem tentativas de dizer o que pode ter causado, mas muitas vezes os médicos simplesmente dizem que pode ser causado por múltiplos fatores. Úlceras, enxaquecas, dores pelo corpo, síndromes do intestino irritável ou da bexiga irritável, fraquezas, insônia, são alguns dos mais comuns.

Claro que muitas dessas situações podem ter sido causados por fatores estilo de vida, por exemplo, comer doces em excesso, dormir pouco, estar com baixa de vitaminas ou alguma deficiência de nutrientes. E muitas vezes pode realmente existir algum fator biológico destes por trás.

Porém às vezes acontece que mesmo com essa situação normalizada, os níveis de vitamina repostos, uma mudança no estilo de alimentação, os sintomas continuam, ou ainda, mudam de a sua forma de apresentar. Uma dor que existia nas costas, de repente some, mas aparece nos ombros, ou se transforma em uma tensão na cabeça.

Parece que estamos correndo atrás de um inimigo imaginário, tentando muito encontrar a causa e resolver o problema, mas ficamos nesse looping infinito achando que finalmente descobrimos, mas na verdade não era bem aquilo.

Não sei se você já passou por isso, mas já acompanhei casos de muitas pessoas que tiveram esse processo essa jornada de busca pela causa do seu sintoma e por um tratamento possível, mas que acabava chegando-se numa conclusão de que parece que nada ia resolver.

Uma tentativa de diversas coisas infrutíferas, uma após a outra. Remédios, mudanças de hábito, procedimentos, até mesmo cirurgias. E nada.

Em alguns desses casos surge a dúvida será que não é um problema psicológico, algo emocional, um estresse, ou algo nesse sentido?

Às vezes é simplesmente uma ofensa para algumas pessoas citar isso ou mesmo considerar essa possibilidade. Outros acham que isso é, digamos que, cientificamente impossível, pois seu sintoma é bem “real”, não tem nada de “psicológico”.

Desde 1905 Freud já enfrentava esse tipo de problema de pessoas que não tinham muita abertura pra ver as coisas sob esse aspecto das causas inconscientes dos sintomas e comportamentos.

Na época as ideias que colocava eram muito pouco científicas

Claro que ele falava de outros assuntos que despertava um incômodo nas pessoas, como questões envolvendo sexualidade e outros afetos reprimidos, que para a população da época (e até hoje) são de certa forma assunto sensíveis e tabus.

Avanços teóricos, limitações práticas

Mas muito se avançou desde então nos campos das teorias psicológicas profundas e analíticas. Já estamos há mais de 120 anos desde que Freud iniciou sua teoria da Psicanálise. Diversas gerações de autores foram surgindo e aperfeiçoando o conhecimento pouco a pouco. A própria neurociência criou sua hipótese sobre o inconsciente, associando com uma parte específica do cérebro.

Mas também muitas outras teorias foram avançando, diversos medicamentos e tratamentos foram sendo criados. Então de certa forma houve uma espécie de concorrência ainda maior em relação às formas de se ver os problemas e também das maneiras de solucioná-los.

Por mais que muitos médicos aceitem a hipótese de que alguns sintomas estejam relacionados com questões emocionais, muitos deles não sabem como direcionar um tratamento assim a não ser indicando para um profissional Psi ou mesmo receitando medicamentos paliativos.

Mesmo dentro do campo Psi temos muitas possibilidades de linhas diferentes. Cada uma com uma leitura muito distinta do que fazer, e como fazer, em cada situação. O ser humano é um animal muito complexo, e de fato nenhuma abordagem está mais correta do que a outra, porém existem sim aquelas mais adequadas para tratar determinada questão, ou atingir determinados objetivos.

A profundidade dos processos analíticos e o caminho para o autoconhecimento

Uma coisa muito interessante das abordagens analíticas é sua busca por entender o ser humano em uma profundidade muito avançada. Por isso que alguns tratamentos psicanalíticos levam anos, pois o nível de aprofundamento nas questões, na formulação e reformulação daquilo que nos faz sofrer, é muito grande. Ir atrás das causas até os primórdios na nossa existência, e até mesmo antes, na relação com a ancestralidade. O que de traumas, desafios, problemas, conflitos, de gerações anteriores, de nossos tataravós, bisavós, avós, pais, é repassado para nós – e que repetimos e revivemos muitas vezes sem saber.

Não que uma análise psicológica dessa forma não possa trazer resultados e benefícios a curto prazo, pois ela de fato traz. Só de mudar a perspectiva em relação às causas de nossos problemas já faz com que nos situamos melhor sobre o que fazer para resolvê-los. 

Às vezes vemos que temos problemas e conflitos que são muito mais profundos e enraizados do que imaginamos, então é claro que o trabalho para superá-los vai ser maior, e levar mais tempo. 

Quem passa por um processo desse acaba desenvolvendo uma visão muito honesta em relação a si mesmo e ao mundo. Paramos de tentar nos enganar achando que vai ser fácil simplesmente resolver uma questão transgeracional, com uma série de medicamentos tomados diariamente, ou mesmo, algumas seções de técnicas comportamentais aplicadas.

inconsciente como um armário cheio de memórias

Acabamos descobrindo que muitos dos nossos sintomas, que às vezes sabemos ter relação com algum estresse diário, ou em outras vezes achamos que tem a ver com outra coisa, estão totalmente relacionados com a nossa personalidade, nossa identidade, nosso modo de ver o mundo, nossos padrões construídos para se relacionar com as pessoas. E isso tudo deriva de como foram nossas experiências na infância, as situações que vivemos, como aprendemos que deveriamos reagir, como deveriamos ser ou não ser, fazer ou não fazer. Somos formados de um sistema muito complexo, que muitas vezes gera sintomas na falta de outra alternativa para representar algo profundamente difícil ou conflituoso que tenhamos vivido, sentido ou pensado. Não é algo simples, como considerar que seu sintoma é psicológico e está resolvido só por isso. É necessário se aprofundar muito detalhadamente em todos os aspectos que fazem parte dele para entender como ele funciona, o que o causa, para enfim, descobrir o que fazer com isso.

O caminho para o autoconhecimento é feito de aberturas e fechamentos. Tem momentos que precisamos de alguns paliativos, algumas coisas que nos façam simplesmente esquecer do sofrimento, deixar de lado toda essa história de problemas acumulados. Mas ficar para sempre assim é simplesmente deixar tudo isso entulhado em um armário que volta-e-meia se abre sozinho com algum objeto aparentemente desconhecido para nos assombrar. Sintomas que surgem do nada e que parecem que não conhecemos a causa, assim como a donzela de Freud.

Comecei com uma frase do Freud e vou terminar com uma do Jung:

“Até você se tornar consciente, o inconsciente irá dirigir sua vida e você vai chamar isso de destino.”